Após sete anos da publicação da Resolução 245 do Denatran, que obriga que todo veículo saia de fábrica com rastreador, o Projeto ainda está no papel. Resolvi resgatar este assunto, o qual já havia escrito um artigo no ano passado, para reforçar que a lei não se sustenta economicamente, já que o custo da prevenção não pode ser maior do que a redução dos prejuízos.
Um ano já se passou após a divulgação de meu primeiro artigo e continuamos na estaca zero. Mesmo com um novo prazo fixado para setembro, ouso dizer que, daqui a um ano, estarei indagando a mesma coisa: Quando a resolução 245 sairá do papel?
Este mês resolvi resgatar este artigo no qual faço uma analise sobre custo x benefício, sob o ponto de vista de redução dos prejuízos totais com roubos de carros e concluo que uma premissa básica de gerenciamento de riscos não é atendida pela resolução proposta. Acompanhe
Veículos com Rastreador de Fábrica – Os obstáculos seriam legais ou técnicos?
Publicada em 27 de Julho de 2007, a Resolução 245 do Denatran que estabelece a obrigatoriedade da instalação de rastreadores em veículos novos, produzidos no Brasil, passou por mudanças e adaptações nestes quase seis anos. O texto original, aparentemente simples e com apenas duas páginas, estabelecia que o registro e licenciamento do veículo estariam vetados no caso do descumprimento do estabelecido na resolução.
O fato motivador, alegado pelo Denatran para a criação desta resolução, seria o elevado número de roubos de veículos no Brasil. Questionamentos com relação à legalidade foram os principais pontos de discussão e de interposições judiciais em função da invasão de privacidade que tal medida iria permitir e da sua, conseqüente, inconstitucionalidade.
Mudanças em suas definições foram introduzidas procurando evitar problemas legais na sua adoção. A opção dada ao usuário de poder decidir quando irá ativar o serviço teve como objetivo contornar os aspectos legais. Isto criou outra fragilidade que iremos analisar mais adiante. As empresas de tecnologia gastaram milhões de reais em desenvolvimento durante estes anos e, após quase seis anos, o assunto ainda vem sendo discutido e as datas de implantação sendo postergadas.
Além dos aspectos legais, vários motivos são alegados para os diversos adiamentos, como a falta de estrutura de comunicação de dados, evolução da tecnologia, adaptação das montadoras de veículos, etc. Porém, não vemos nenhuma análise sob o ponto de vista econômico. Este, a meu ver, tem sido o real motivo deste projeto não sair do papel.
Quando tratamos com a possibilidade de perda, um principio básico é que o custo da prevenção não pode ser maior do que a perda provável. As companhias de seguro conhecem bem isto.
Então fica a seguinte pergunta: Os gastos com investimento e custeio deste projeto são compensados pela redução dos roubos de veículos?
A análise que vamos fazer se baseia na frota segurada.
Conforme os dados da SUSEP – Superintendência de Seguros Privados, em 11.827.094 veículos expostos entre julho de 2010 e junho de 2011 (dados mais recentes disponíveis), tivemos um volume de indenizações relativas a roubos de 2.713.131.531. Isto leva a um valor médio mensal de R$ 19,12.
Porém, neste universo, encontramos veículos de maior valor. Veículos importados, caminhões, etc.
Se analisarmos, apenas, a frota de veículos de Passeio Nacional, o número de veículos expostos foi de 9.049.900 e o valor das indenizações relativas a roubos foi de 1.692.487.898. Neste caso o prejuízo médio mensal por veículo segurado foi de R$ 15,58.
O custo da prevenção não pode ser maior do que a perda provável, pelos critérios de gerenciamento de riscos, conforme foi dito antes. Portanto, o custo do serviço de rastreamento obrigatório somente será viável economicamente se o valor for inferior a R$ 15,58.
É sabido que a frota segurada concentra os veículos com maior risco de roubo. Os proprietários de veículos visados são mais estimulados a fazer seguro do que os outros proprietários. Portanto, esta análise possui um viés com tendência a apresentar um índice de roubo maior do que o universo total de veículos. Sendo assim, esta análise aplicada a toda a frota nós levará a um valor ainda inferior as R$ 15,58.
Este valor está considerando que o prejuízo com roubos de veículos seria reduzido a ZERO.
Porém, a não existência do elemento surpresa e a consequente facilidade de inibição do sistema pela padronização do equipamento, do local de instalação e do surgimento dos inibidores de sinais de celular e de GPS, nos levam a acreditar que a eficiência de 100% ficará longe de ser atingida. Somente a prática poderá nos mostrar qual será este valor.
Os preços médios praticados pelas empresas de rastreamento que utilizam a tecnologia definida pela resolução giram em torno de R$ 60,00 mensais, muito acima do valor máximo citado acima.
Sobre os custos e receitas do sistema, ainda temos outros pontos a considerar:
1 – A ativação do sistema será opcional. Sendo assim, os custos dos equipamentos não ativados terão que ser rateados pela frota que optou pela ativação.
2 – A resolução estabelece que o usuário poderá solicitar a ativação a qualquer momento. Sendo assim, por que motivo ele ira ativar o sistema e passar a ter um custo mensal sem que o veículo tenha sido roubado? Sabendo que o veículo possui um rastreador que pode ser ativado a qualquer momento, ele poderá esperar a ocorrência do sinistro e ativar quando necessário. Certamente os usuários que optarem pela não ativação irão descobrir isto rapidamente. Muitos dos que optaram pela ativação poderão mudar sua decisão quando perceberem que poderão agir da mesma maneira. Mesmo criando-se a obrigatoriedade do usuário pagar a mensalidade pelos 12 meses seguintes à ativação, ainda assim será vantagem para ele. Seria como se ele pudesse fazer uma apólice de seguro após o veículo ter sido sinistrado.
Desta forma os custos do sistema serão rateados por uma parcela menor do que a totalidade e a viabilidade econômica do sistema ficará ainda mais comprometida.
Estando esta análise correta, as dificuldades não serão apenas de implantação. O sistema terá enorme dificuldade de se sustentar economicamente.
Por Eduardo Meirelles – Pós-graduado em engenharia de segurança pela UFRJ. participou da elaboração de normas técnicas relativas à proteção do meio ambiente pela ABNT. Também foi sócio diretor de uma empresa da área de logística. Atualmente ocupa a Gerencia de Pesquisas & Desenvolvimento da 3T Systems.